Para quem não acompanhou as conversas que antecederam o anúncio do governador Eduardo Leite, de que renunciará ao mandato e seguirá no PSDB, a decisão parece desprovida de lógica. Leite trocou o convite de Gilberto Kassab para ser titular no PSD pelo posto de reserva de João Doria, para quem perdera a posição de candidato a presidente na prévia de novembro.
Quem acompanhou e assistiu à longa entrevista de Leite no Palácio Piratini constatou que existe não apenas lógica, como uma articulação do PSDB com outros partidos (MDB, União Brasil, PSD e Cidadania) e movimentos da sociedade civil para tentar viabilizar sua candidatura, apesar de Doria, da prévia e das versões oficiais de respeito ao resultado da disputa interna.
— A renúncia me abre muitas possibilidades, mas não me tira nenhuma — repetiu Leite sempre que perguntado sobre a que outro cargo poderá concorrer se não for candidato a presidente.
Em tese, isso significa que ele pode ser candidato ao Senado, a deputado federal ou até mesmo governador. O que ele quer mesmo é tentar o Planalto, convencido de que pode ser o ungido para quebrar a polarização entre o ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), que define como “disputa entre um passado ruim e um presente que não agrada”.
Apesar do compromisso assumido de não disputar o segundo mandato, Leite disse que vai trabalhar “pela reeleição do projeto, com outro candidato”, preferencialmente o vice-governador Ranolfo Vieira Júnior, mas em seguida ressalva:
–Qualquer entendimento diverso, não partirá de mim.
A única anotação que Eduardo Leite levou para a entrevista em que explicou sua decisão foi a transcrição de uma fala de João Doria no BTG Pactual em 22 de fevereiro e que leu duas vezes.
Disse Doria: “Eu amo o Brasil e, em nome desse meu amor pelo Brasil, eu não vou colocar meu projeto pessoal à frente daquilo que sempre foi a índole que me fez ter orgulho de ser brasileiro. O meu país, o povo do meu país, é mais importante do que eu mesmo. Então, se chegar lá adiante, e lá adiante tiver de oferecer meu apoio para que o Brasil não tenha mais essa triste dicotomia — de ter Lula ou Bolsonaro — eu estarei ao lado daquele e de quantos forem os que serão capacitados para oferecer uma condição melhor ao Brasil”.
ALIÁS
O telefonema de Eduardo Leite para João Doria, descrito pelo governador gaúcho como “uma conversa amistosa e cordial”, é uma dessas pérolas do cinismo político. Doria pode até ter disfarçado o rancor, mas em São Paulo chama Leite de “golpista” por tentar tirá-lo da disputa presidencial.
No dia em que completou 37 anos, Eduardo Leite estava em Washington. Questionado pela coluna sobre o que seu pai achava das especulações sobre seu futuro político, resumiu:
— Meu pai não quer que eu concorra à reeleição, porque é obstinado pela palavra empenhada e eu disse que não disputaria o segundo mandato. E não quer que eu saia do PSDB.
E a mãe?
— Por ela eu não concorreria a nada, mas sempre me apoia.
Naquele dia, parecia impossível fazer o que o pai, José Luiz Marasco Cavalheiro Leite, pedia: tudo indicava que ele seria candidato a presidente pelo PSD. Nesta segunda-feira, Marasco e a esposa, Rosa Eliana de Figueiredo, esperaram a entrada do governador no Salão dos Espelhos do Palácio Piratini sentados na primeira fileira de cadeiras, entre os jornalistas. No rosto, o sorriso de alívio por ver o filho no PSDB, focado em um projeto nacional.
Fonte: GZH